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Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 4)

• Por Alfa Romeo
Capítulo 4 do incrível artigo elaborado por Alberto Maurício Caló sobre o Circuito da Gávea.
Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 4)

CIRCUITO DA GÁVEA – 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro

(CAPÍTULO 4)                                                                       Por Alberto Maurício Caló


VELOCIDADE NOS TRILHOS

Os trens em 1937 

Chegou a hora de falar de um dos meios de transporte mais rápidos e populares da época: os trens.

Os trens também continuavam sendo símbolo da modernidade. Operacionais e rápidos desde a segunda metade do século 19 eles foram instrumentais para o desenvolvimento do Brasil e escoamento da nossa principal riqueza para exportação da época, o café.

As grandes estradas de ferro, principalmente as de origem inglesa, foram símbolos de uma nova estrutura empresarial, da adoção organização e métodos, de uma política de recursos humanos e outros aspectos que revelaram um novo “padrão” de gestão para os empresários brasileiros.

Viajar de trem foi a primeira visão da modernidade em locomoção para o brasileiro do século XIX. Uma verdadeira competição mundial por velocidade e luxo nas viagens de trens já se iniciara no século XIX e continuava no século XX e, de certo modo, até hoje.

Na década de 1930 já coexistiam diversas formas de propulsão e havia acirrada disputa onde valia tudo. Sempre lembrando que eram trens com apoio físico de roda nos trilhos (nada de levitação magnética) mas com propulsão variada. No final de seus dias de glória os trens a vapor estavam atingindo o limite de seu desenvolvimento, mas ganhavam concorrência dos diesel, dos diesel-elétricos, dos elétricos e dos com motor a gasolina (ou gasolina em uma mistura específica). Os trens já tinham locomotivas de formato aerodinâmico (streamliners). Desnecessário dizer que no setor de trens e locomotivas disputavam -como sempre - ingleses, italianos, alemães, franceses e americanos.


Foto: O  Schienenzeppelin ou “Zeppelin Ferroviário” foi um projeto alemão lançado em 1929. Com motor BMW 12 cilindros a gasolina e hélice traseira, nunca foi um trem operacional e seu recorde de 230,2 Km/h em junho de 1931 na ferrovia Berlim-Hamburgo foi antes um experimento do que um verdadeiro parâmetro de velocidade ferroviária, ainda mais por não poder puxar composições. Seu design frontal antecipa em 30 anos os dos famosos trem-bala japoneses (shinkansen) da década de 1960.


Foto acima: Em junho de 1937, data de nossa prova na Gávea, o recorde oficial de velocidade era o estabelecido em maio de 1936, entre Berlim e Hamburgo, na Alemanha. A locomotiva a vapor Borsig DRG Classe 05 DB 002 atingiu a velocidade de 200,4 km/h, em trecho horizontal da via livre, com quatro carros e peso total de 197 toneladas.

Foto abaixo. A New York Central “Hudson”:



As locomotivas americanas da classe Hudson a vapor também eram das mais rápidas e usadas por várias ferrovias entre as quais a New York Central Railway. As Hudson tiveram dois modelos aerodinâmicos “streamlined”. A primeira foi lançada em dezembro de 1934. Uma Hudson batizada “Commodore Vanderbilt” (em homenagem ao magnata das ferrovias americanas), recebeu um acabamento aerodinâmico (foto a seguir). Mais para o final dos anos 30 as Super-Hudsons adotaram o padrão acima visto no desenho estilo “art deco” de uma das locomotivas da New York Central. As Hudson normalmente eram trens capazes de mais de 160 kms/h. Em suas melhores versões uma das Hudson teria chegado a 197,95 kms/h.


Foto: uma das mais famosas “streamliners” foi a Locomotiva Hudson “Commodore Vanderbilt” vista acima deixando Chicago em 1935, tendo ao fundo o famoso prédio da Bolsa de Chicago (Chicago Board of Trade).


A Union Pacific M 10000 Streamliner foi outra famosa proposta americana de trem leve e aerodinâmico leve para passageiros. Lançada em 1934, a diesel -elétrica, nas famosas cores “canary-yellow over golden brown”, recebeu carros da lendária “Pullman Company” com extensivo uso de alumínio e era capaz de cerca de 110 mph (176 km/h).


Foto: As locomotivas a vapor chegaram ao ápice de seu desenvolvimento antes da Segunda Guerra e ainda estavam disputando palmo-a-palmo os “records” com as locomotivas elétricas, diesel-elétricas e a gasolina. 

Não por acaso o único recorde de velocidade que sobrevive até hoje é o recorde das locomotivas a vapor. 

Em 1936 a partir de um projeto de Sir Nigel Gresley, os britânicos construíram as locomotivas a vapor do tipo A4 que receberam um acabamento aerodinâmico “streamlined” e se mostraram muito rápidas. 

Em julho de 1938 o experiente maquinista Joseph Duddington e o foguista Thomas Bray levaram uma composição de sete carros e 240 toneladas puxada pela A4 4468 batizada de “Mallard” a 202,6 Km/h e a máxima de 203 Km/h no leve declive de Stoke Bank em direção a Grantham Esse recorde para locomotivas a vapor sobrevive até dias de hoje bem como a lendária locomotiva “Mallard” que repousa – gloriosa- no Museu Ferroviário Nacional de York.


Entre as locomotivas elétricas os italianos conceberam a série ETR 200 (ETR para Elettro Treno Rapido) fabricada pelas Industrias Ernesto Breda. Em 6/12/37 a ETR 201 atingiu 201km/h na linha Roma-Nápoles e em 1939 a ETR 212 conduzida pelo Maquinista Alessandro Cervellati fez a média de 165 Kms/h entre Florença e Milão com máxima de 203 Km/h (novo record para a categoria das elétricas).


As locomotivas a vapor americanas Milwaukee Road, classe A, tipo “Atlantic” eram muito rápidas e tinham design “streamlined”. Das quatro fabricadas, a número 2 assinalou 181,1 km/h em maio de 1935 entre Milwaukee e New Lisbon (Wisconsin).

Na parte das diesel-elétricas a alemã DRG SVT 137 número 233-234 da classe “Bauart Leipzig” chegou a 205 km/h em 17/2/1936 na rota Berlim -Breslau -Beuthen (primeira Diesel a mais de 200 km/h). 


Muitos brasileiros lembram desse “design” de trem visto aqui por muitos anos, mas foi em 1937, ano de nossa corrida, que surgiram as famosas locomotivas diesel EMC da “série E” da Electro Motive Corporation (EMC) depois incorporada pela GM dando origem à GM Electro Motive Division (ou EMD). O design das EMDs com seu “slant nose” (nariz inclinado) se tornaria um clássico nas ferrovias. Rápidas, para até 160 Km/h, elas ficariam em produção de 1937 a 1964 com natural evolução técnica e leves alterações de “design” conforme operadora (na foto acima uma EMD da Southern Pacific vista nos anos 40).


Bugatti não fazia apenas carros. Os autocarros de passageiros Bugatti WR (WR para “wagon-rapide”) contavam com quatro motores do gigantesco e luxuoso Bugatti Royale- tipo 41 de 12,75 litros e cerca de 200 hp cada (com combustível à base de gasolina, álcool e benzeno). Eles faziam a rota Paris-Lyon e eram capazes de mais de 170km/h sendo que um deles atingiu 196 kms/h em 1934 batendo o recorde de velocidade em trilhos naquele ano.

NO BRASIL: Para finalizar o capítulo sobre os trens na década de 30, é preciso notar que de trem chegaram ao Rio muitos espectadores para a prova da Gávea de 1937. Alguns paulistas vieram nos navios transatlânticos que faziam o trajeto de volta à Europa a partir da escala de Santos até o Rio de Janeiro.O jornal “O Imparcial” noticiou que pelo navio italiano Conte Grande vieram 96 turistas de São Paulo para a corrida e  que...”outros 314 turistas de São Paulo vieram de trem chegando às 6:45 no Rio seguindo por ônibus especiais para o circuito (as refeições serão distribuídas em caixetas no próprio “trampolim do diabo” a exemplo do que se faz nos grandes certames internacionais...Hoje mesmo os turistas deverão regressar a São Paulo partindo o trem especial às 19 horas..”


Entre os mais de 120 anos que permearam as viagens ferroviárias de passageiros entre Rio e São Paulo, a partir de 1929 entrou em operação o famoso “Trem Cruzeiro do Sul”, antecessor dos não menos famosos trens “Santa Cruz” e do “Trem de Prata”.

Em 1937, ano de nossa corrida, era o Cruzeiro do Sul o símbolo da elegância nos trilhos  entre Rio e São Paulo.O Cruzeiro do Sul (propaganda acima) inaugurou uma nova era de luxo e conforto no transporte ferroviario entre Rio e São Paulo. Entrando em serviço na E. F. Central do Brasil em 1929, tinha 12 carros dormitórios, 3 carros-restaurantes tracionados por locomotivas a vapor americanas do tipo Pacific da “Baldwin Locomotive Works” de bitola larga sendo que os novos vagões de aço eram construidos pela  American Car and Foundry Company (ACF) e elegantemente pintados em azul escuro com frisos amarelos. A ACF foi a pioneira mundial na construção de vagões inteiramente de aço para passageiros e suas rivais americanas eram as igualmente famosas Budd Company e Pullman Company (cujos vagões “Pullman” eram sinônimo de luxo nas ferrovias paulistas).  Devido a essa cor azul de seus vagões, o Cruzeiro do Sul passou a ser apelidado de “Trem Azul”. Anúncios da época relatam que “um interfone ligava os camarotes ao “Club-Car” (restaurante) podendo ser solicitado serviço de “sandwiches” variados, chá, matte, torradas, pão, manteiga, “cocktail do dia”, sorvete, leite, chocolate, café, biscoitos e refrescos” Em 1945 as locomotivas a vapor foram substituídas pelas diesel-elétricas e em 1950 veio o novo Trem Santa Cruz com seus carros de aço inox estabelecendo um novo padrão para o luxo ferroviário brasileiro.

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