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Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 17)

• Por Alfa Romeo Clube do Brasil
Capítulo 17 do incrível artigo elaborado por Alberto Maurício Caló sobre o Circuito da Gávea.
Circuito da Gávea: 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro (Cap. 17)

CIRCUITO DA GÁVEA – 1937 - GP Cidade do Rio de Janeiro

(CAPÍTULO 17)                                                                         Por Alberto Maurício Caló 


OS CONCORRENTES UM A UM

Vamos abordar um a um os concorrentes e seus carros privilegiando sua carreira até a prova da Gávea de 1937 e a tentativa de identificação de seus carros. Vamos priorozar os concorrentes que efetivamente largaram. Eles serão apresentados nos próximos capítulos de forma aleatória. Mais tarde vamos falar da ordem do grid de largada.


NASCIMENTO JUNIOR

Brasil

Equipe: Particular

Carro: Alfa Romeo Tipo B (P3) (chassis 50008?)


Nascimento Júnior foto correio da manhã 6/6/37

Arthur Alberto Nascimento Junior (1902-1945) era um gentleman driver paulista. Sua família tinha uma empresa do ramo metalúrgico e seu esporte inicial foi o remo no qual se destacou no famoso Club de Regatas Tietê na capital paulista. Foi visto nas competições automobilísticas desde 1926. Ainda nesse ano, competido com um Marmon, ganhou a taça “Rei do Volante” o que lhe valeu o apelido “perpétuo” de “Rei do Volante”. Em 1927 e 1928 obteve vários sucessos já com um Bugatti T35. Após um longo hiato nos qual se casou e teve três filhos, Nascimento Jr reapareceu de forma fulgurante em 1936 com um Ford V-8 adaptado vencendo em Poços de Caldas, ficando em sexto na Rampa do Ascurra (no Rio) e depois afrontou as duas principais provas do calendário, onde abandonou no Circuito da Gavea e ficou em 6º lugar GP Cidade de São Paulo. Ainda com o Ford venceu em Porto Alegre em fevereiro de 1937 após bela disputa no início da corrida contra o lendário ídolo local Norberto Jung (também com Ford V-8). Para a grande prova do ano de 37, a Gávea “internacional”, Nascimento Junior percebeu lucidamente que a “régua estava subindo” e trouxe, quase às vésperas da prova, um Alfa Romeo Monoposto tipo B (ou P3) por alguns identificado um carro de 1934 como tradicional motor Alfa de 8 cilindros em linha, já especificamente equipado com o motor de 2.900cc de cerca de 255 HP. Essa versão afirma ser um carro “ex-Scuderia Ferrari”. Seria, por conseguinte um dos Alfas P3 transferido pela fábrica à Scuderia Ferrari, ou um dos carros montados na própria Scuderia e ali recebido a numeração SF 39.

No entanto o livro de Guillermo Sanches “Fuerza Libre” atribui o numero SF 39 ao chassis 5.009, que o livro “Alfa Romeo - Argentina” de Bertschi e Iacona referem mais exatamente como 50009 o famoso P3  importado para a Argentina pelo Dr. Italo de Lucca  e estreado por nas mãos Vittorio Coppoli, seguindo-se uma longa carreira com diferentes pilotos. 

Vários autores dão conta que em 1934 a Scuderia Ferrari teria construído 9 Alfas P3 já com o motor 2.900 (versão mais corrente) e que as numerações seriam SF 38 ao SF 47 (sobre essa numeração pairam dúvidas).

Porém, para alguns a primeira P3 dessa nova configuração, construída em 1934 iniciaria a segunda série a numeração maior 50 001 (50 001 a 50 010 ou pouco mais) e o primeiro chassis 50 001 (que logo passou às mão particulares do famoso piloto anglo-brasileiro Luis Fontes) recebeu na Scuderia a estampa SF 41 e os seguintes estariam em ordem numérica ascendente (50 002 seria o SF 42 e assim por diante).

Isso não é certeza, pois frequentemente se verificavam números de chassis Alfa mais antigos com numeração “SF” mais nova, embora a partir do P3 tivesse havido uma certa correspondência cronológica em números ascendentes conforme o passar dos anos.  

O carro de Nascimento Jr. teria chegado ao Brasil com a placa VA 10847 (indicando um carro matriculado na Itália com placa de Varese). A presença de uma placa de circulação não quer dizer muita coisa. Em primeiro lugar esses carros iam para muitas competições rodando, principalmente para as subidas de montanha no interior da Itália. Assim sendo quase todos eles tinham uma placa de circulação italiana. Anos mais tarde carros da Scuderia Ferrari normalmente tinham a placa inicial de MO (Modena) e assim que trocavam de donos recebiam novas placas italianas. A lembrar que até meados dos anos 60 quando a Ferrari não tinha sua pista particular e tinha que fazer rápidos testes de funcionamento pelas estradas de Modena, até mesmo os Formula 1 tinham pequenas inscrições na carroceria “Prova MO .. número” identificando uma “placa de testes” das autoridades de trânsito de Modena.

Assim a presença da placa no carro de Nascimento Junior reforça ser um carro com alguma idade (3 a 5 anos) como eram as P3 em 1937, possivelmente para participar de provas de subida de montanha e de estrada na Itália onde os carros iam rodando em ruas e estradas abertas e praticamente todas que rodavam na Itália tinham placas de circulação. 

O fato de ter um motor de maior cilindrada das P3 de segunda série também não tem muito significado pois vários P3 mais antigos tenham recebido esse “upgrade”. 

Mas as  P3 de primeira série da Scuderia Ferrari tinham numerações menores (chassis 5001 a 5006 ou talvez um pouco mais segundo diferentes versões).

Pelo que se sabe hoje, algumas correspondências (chassis/registro) da Scuderia Ferrari  são conhecidas, outras não.  Nas P3 de “primeira série” o chassis 5001 seria o SF 34, 5002 o SF 38, 5003 o SF 37. O 5004 também da Scuderia seria destruído na Europa no acidente fatal do lendário Guy Moll.

Consta para muitos que o 5006 também seria um chassis da Scuderia Ferrari, mas a ele se atribui a numeração SF 33, o famoso chassis de Georges Raph com histórico posterior na Grã Bretanha.  

Simon Moore nos alerta em seus livros a falta de registros e um tendencia à confusão dessa numeração ao longo dos anos e lembra de ter encontrado dois SF 33 apenas porque havia correspondência do ano de construção com o ano do calendário civil de 1933.

Como se vê a questão das numerações de chassis da Alfa e as correspondências com numerações da Scuderia Ferrari são até os dias de hoje um certo mistério mesmo para os autores e historiadores mais renomados.

Vontando ao carro em questão, é importante notar que várias fontes (jornais da época) dão como certo que Nascimento Jr comprou seu carro diretamente de Enzo Ferrari (corroborando tratar-se de um carro ex -scuderia Ferrari). Para alguns era um P3 construído em 1933, para outros construído em 1934. Isso faria alguma diferença porque quando o regulamento europeu foi modificado em 1934, passou a existir uma dimensão mínima do “cockpit” para os monopostos. Então existem P3 antigos de carroceria “pequena” ou “estreita” e P3 “do novo regulamento” com carroceria mais larga. Parece a princípio que o P3 de Nascimento Jr. seria de carroceria estreita e que, como noticiado, teria sido reformado e apresentado na Gávea nas cores brasileiras de “carroceria amarela com chassis verde”. È possível qualquer coisa quanto à configuração da carroceria porque na América do Sul a dimensão ou largura da carroceria não faria a menor diferença.

Assim, na crença de que o carro de Nascimento Junior fosse um “ex-Scuderia Ferrari” comprado junto à Enzo Ferrari após reforma na própria Scuderia teríamos que abrir três hipóteses: 

a)     A primeira no sentido de descartar duas numerações de chassis de P3 que correram na América do Sul. Assim, uma P3 da primeira série, provavelmente construída em 1932, usada pela Scuderia Ferrari foi o chassis 5001 (ex Pintacuda e ex. Maremmana que já descrevemos acima). Segundo os autores argentinos Bertschi e Iacona esse chassis só chegaria à América do Sul no pós guerra e diretamente na Argentina.  O livro de Guillermo Sanches “Fuerza Libre” na pag. 56 cita o carro comprado pelo ACB para Teffé como um “vetusto” P3 com motor 3.2 e lhe atribui o número de chassis 50010 que também é um carro com histórico diferente. Assim embora essas duas P3 sejam “ex- Scuderia Maremmana” e tenham histórico sul americano, são certamente carros distintos da P3 de Nascimento Jr;

b)    A segunda hipótese, muito remota, é que esse fosse um P3 de primeira série como o misterioso chassis 5005 hoje no Museu Histórico da Alfa Romeo com curriculum desconhecido. Esse é considerado um P3 de chassis “pequeno” (carroceria estreita) o que  teoricamente “bate” com a configuração do carro de Nascimento Jr. mas de resto o carro do Museu está inclusive com motor da primeira série (2,6 litros)  Para certas fontes esse chassis do Museu teria sido o SF 38. O chassis 5.005 é um verdadeiro “mistério” ainda a ser desvendado pelos especialistas;

c)     Por fim a hipótese predominante é de que o carro de Nascimento Jr. corresponderia uma numeração posterior de P3 sendo o chassis 50008 (fabricado em 1934) ainda com carroceria estreita mas já com o motor 2,9 (mas ainda não com o 3,2 litros) ao qual a Scuderia Ferrari tivesse atribuído em duplicidade o número SF 39, o que seria improvável, mas não impossível conforme a anotação de Simon Moore. Essa hipótese é a mais difundida ente os historiadores e bate com as outras informações iniciais, mas é dificultada pela falta do histórico posterior desse chassis e de seu presumível “desaparecimento”.

Fato é que o P3 de Nascimento Junior chega muito bem apresentado, evidentemente com uma carroceria estreita monoposto e com o motor 2,9 (e cerca de 255 hp) das P3 de segunda série e é um carro que por todas as fontes veio da Itália comprado junto `Enzo Ferrari. Dando crédito à versão que fosse um ex-Scuderia Ferrari, podemos acreditar que a própria Scuderia tivesse reformado um chassis P3 com motor 2,9 e uma carroceria bem restaurada,e com nova pintura. 

Esse seria o carro que o volante brasileiro vai pegar no Rio de Janeiro.com aparência de um carro recém reformado e o bom aspecto significa uma reforma geral por quem entendia do assunto presumivelmente a própria Scuderia Ferrari como indicam todas as fontes. O reflexo das fotos até demonstra os pneus que parecem novos com laterais ainda não “marcadas” por eventuais raspadas.

 


 Fotos: Nascimento Junior Alfa Romeo monoposto Tipo B ou P3.


 

Conforme artigo do historiador Napoleão Ribeiro, Nascimento Jr ainda teria bela carreira vencendo a Gávea Nacional de 1938 e chegando em 4º lugar na Gavea Internacional do mesmo ano (brasileiro melhor colocado na prova). Ele arrematou a temporada vencendo a prova “ Comércio e Indústria” no Bairro do Pacaembú (SP). Já com uma Alfa 8C 35 (ex Carlos Arzani) Nascimento Jr. fez a melhor volta da Gávea de 1939, mas não terminou. Com o mesmo carro venceu em junho de 1940 a prova inaugural do Circuito de Interlagos assinalando uma gloriosa despedida das corridas de Grand Prix.  Ele voltaria curiosamente em 1943 com grande sucesso nas provas de carros de turismo movidos a gasogênio, para promover o equipamento produzido em sua própria metalúrgica e muito em uso nos anos da Segunda Guerra Mundial. Com um Chevrolet a gasogênio fez sua última aparição em 1943 vencendo o Circuito da Amendoeira no Bairro do Flamengo (RJ) O famoso “gentleman driver” paulista faleceu em 1945 aos 43 anos de idade.

 

CARLOS ARZANI

Argentina                                                                                                                     

Equipe: Particular

Carro: Alfa Romeo 8C 35 (chassis 50014 motor 50014)

Carlos Oscar Arzani 1909-1952 era descendente de uma importante família com múltiplos interesses empresariais, entre os quais a operação de uma frota de ônibus. Ainda muito jovem em 1931 manifestou seu gosto pelas corridas e estreou com um Ford V-8 adaptado. Foi visto depois com um REO com o qual participou do Grande Prêmio de Arrecifes e do Grande Prêmio de Turismo em Córdoba, sem sucesso. Na temporada de 1932 se apresentou em quatro ocasiões sem maiores destaques. Reapareceu em 1935 com um híbrido REO-Chrysler onde conseguiu um bom 4º lugar no Grande Premio do Moto Club Argentino. Ainda no mesmo ano, mas já com um Ford V-8 adaptado foi visto em Entre Rios onde também não se classificou para a etapa final. Em 1936 sempre com um Ford V-8 abandonou no GP Virginio Greco em fevereiro e também as 200 milhas de Tucuman em junho.

Mas Arzani já estava maduro como piloto e pronto para voos mais altos. Arzani se acercou de Ricardo Carú, um piloto experiente e já com carreira internacional que famosamente tinha vencido o Circuito da Gávea em 1935. Carú seria um amigo, preparador e manager para o jovem Arzani.

Em 1936  Carú estava de volta à Gávea para “defender” seu título de campeão reinante da prova brasileira, mas logo viu que o mundo tinha mudado. Seu Fiat esporte adaptado nada mais tinha a fazer. Além da dominação quase humilhante das novas Alfas 2.900 A “Botticella” da Scuderia Ferrari, Carú se viu também dominado pelas Alfas Monza de Helle Nice e Teffe e outros carros mais modernos. Mas “carreras son carreras” e essa corrida da Gávea de 1936 acabou nas mãos do Bugatti de Vittorio Coppoli. 

No entanto a mensagem estava dada, tanto que logo depois Pintacuda e Marinoni impuseram as Botticellas com toda a facilidade do mundo no GP de São Paulo.

O jovem Arzani escutando pelo rádio a prova da Gávea pediu que Carú levasse uma proposta para os representantes da Scuderia Ferrari para ficar com uma das Alfas 2900 A. mais precisamente aquela que vinha de vencer o GP de São Paulo. Após uma recusa inicial, a Scuderia Ferrari logo se viu seduzida pelas “polpudas” 95 mil liras italianas e logo despachou a Botticella para a Argentina, emitindo, em julho de 1936, um recibo para Carú através da representação da Fiat na Argentina como assinalam Bertschi e os irmãos Iacona em um magnífico livro sobre esse carro.

E foi justamente aí que a carreira de Arzani decolou. Despachada diretamente do Brasil pelo navio Asturias em agosto de 1936, no mesmo mês Arzani estreou a Alfa no GP de Venado Tuerto em Santa Fé onde abandonou após marcar a pole position e a melhor volta. Em Rosário não pode largar por conta de uma quebra na caixa de câmbio após fazer o melhor tempo nos treinos.  Na prova eliminatória das 500 Milhas Argentinas em Rafaela largou em segundo, mas se instalou na liderança com autoridade para abandonar com o tanque furado após assinalar o novo record da pista. 

Desistiu de competir em Bahia Blanca devido ao piso precário do circuito e no Circuito de Lincoln usou seu Ford V-8. Finalmente no GP Cidade de Buenos Aires em 18/10/1936 no novo traçado da Costanera Norte e diante de cerca de 50.000 espectadores, Arzani perdeu por muito pouco a sua série na eliminatória mas garantiu sua participação na final onde se impôs com sua Alfa estabelecendo o record do novo circuito. 

A primeira vitória justamente uma prova assim importante na Capital Argentina deixou Arzani emocionado até as lágrimas. Ainda no final de 36 não largou em Santa Fé após uma quebra nos treinos. E abandonou em La Tablada. Já em 1937 venceu em janeiro em Mar del Plata (Circuito El Torreon) e em março venceu em La Plata (Circuito Del Bosque), colocando uma volta de vantagem no segundo colocado.

Nesse momento a Botticella, já pintada nas cores nacionais argentinas (azul com capô amarelo) volta à Itália para uma revisão geral e com a perspectiva de Arzani com ela participar das Mille Miglia e trazê-la para o Circuito da Gávea de 1937.

Mas precisamente nesse momento funcionou a famosa sedução de Ferrari sobre seus clientes. Ferrari sabia que seus carros de 1937 não se enquadrariam no regulamento europeu de 1938 e que, portanto, era hora de começar a vendê-las aos pilotos particulares e Arzani já vinha precedido de uma fama de “bom cliente” não só por ter comprado a Botticella, mas por tê-la conduzido em várias vitórias argentinas, fato que Ferrari também apreciava e que colocava Arzani no “radar” da Scuderia. 

Ferrari sem dúvida tinha “faro” para identificar bons pilotos ascendentes. 

Por óbvio lá estava uma magnífica Alfa 8C 35 da Scuderia revisada (chassis 50014)  pela qual Arzani desembolsou 190.000 liras italianas mais 5.000 liras em peças sobressalentes, sem contar o preço de uma revisão geral na “botticella”. Outra vez o recibo foi emitido em nome de Carú que lá estava auxiliando a negociação.

Para completar o pacote, sabiamente Arzani acertou sua participação em uma prova italiana com o novo carro o que lhe deu oportunidade de se adaptar à nova máquina e medir forças com outros bons pilotos italianos, participando ainda sob o “manto protetor” da assistência da Scuderia.

Assim em 25/4/37 Arzani acompanhava a Scuderia Ferrari na II Coppa Principessa del Piemonte no Circuito de Posillipo em Nápoles. Alí presentes pela Scuderia estavam Farina e Biondetti (Alfa 12C 36), Eugenio Siena Alfa (8C 35) e Villoresi (Alfa 8C 2.900-A).

Nessa prova, válida para o campeonato italiano, a 8C 35 de Arzani já estava elegantemente apresentada nas cores argentinas (azul com capô amarelo). No treino com pista molhada Arzani assinalou um belo segundo tempo no grid atrás apenas da 12C de Farina. Com campo fraco de competidores a Scuderia fez uma “demonstração”, mas Arzani se manteve algum tempo na segunda posição atrás de Farina e acabou em quarto lugar. A prova terminou com Farina, Biondetti, Villoresi, Arzani e Siena nesta ordem.

Em seguida Arzani desistiu de uma eventual participação no importante GP de Trípoli na Libia em 9/5/37 onde a Scuderia iria encontrar a Mercedes e a Auto Union com suas equipes completas. Voltando da Europa no Conte Grande a 8C 35 e a Botticella ficaram na escala do Rio de Janeiro e Arzani desembarcou em Buenos Aires em 27 de maio. 


Foto: Carlos Arzani como bom filho do pampa saboreia um mate apoiado na suspensão de sua magnífica Alfa.

 


Foto: “New Star”: o famoso gentleman driver argentino e o Alfa Romeo. Sua imagem na capa de “El Gráfico” o eleva à categoria das grandes personalidades argentinas da época.

O incrível dessa história é que em junho de1936 Arzani sequer tinha experiência internacional e era apenas uma jovem promessa do automobilismo argentino e no prazo  de um ano se converteu em um piloto vencedor, com experiencia internacional e na maior esperança argentina para a palpitante Gávea de 1937.

Imaginem: no dia da Gávea de 1936 Arzani era um ouvinte distante de uma Rádio Argentina, já um piloto promissor mas que ainda não tinha sequer uma vitória em seu cartel. No dia da Gávea de 1937 ele era o sul americano com mais chances de vitória. 

Certamente entre uma e outra foram os 12 meses mais empolgantes da vida de Arzani.

Conforme já falamos o Alfa 8C 35 Foi apresentado do GP da Itália em Monza em setembro de 1935. Era a evolução natural do P3, mas com novo chassis, suspensão independente nas 4 rodas e uma carroceria mais aerodinâmica. Seu motor era a última evolução do famoso 8 cilindros em linha agora com 3,8 litros e compressor, Não se sabe ao certo o numero de 8C 35 construídos, mas estima-se que tenham sido seis carros. 

O de Arzani um carro ex-scuderia Ferrari é um dos poucos que podem ser bem identificados e seria reconhecidamente o chassis e motor 50014 (numeração da Scuderia Ferrari SF 64).

Sem nos alongarmos sobre os fatos posteriores à Gavea de 1937, devemos resumidamente notar que em março de 1938 Arzani ganhou uma prova na Cidade de Necochea que foi a primeira participação oficial em corridas do futuro pentacampeão mundial Juan Manuel Fangio. Ainda em 1938 foi na Gávea que Arzani fez uma de suas mais belas apresentações internacionais com a Alfa 8C 35 liderando a parte inicial da prova, mas tendo que se contentar com um segundo lugar diante de um Pintacuda “impossível” debaixo da chuva que caiu na segunda parte da prova. 

Pintacuda estava na Alfa 308 C mais moderna, mas levemente menos potente que a 8C 35 mais antiga de Arzani. A 8C 35  de Arzani era uma 3.8 com compressor que desenvolvia cerca de 330 hp e a 308 C de Pintacuda era uma 3 litros com compressor que desenvolvia cerca de 295 hp.

Após outras tantas vitórias na Argentina Arzani vendeu a 8C 35 ao brasileiro Nascimento Jr. e tinha perspectiva de correr na Europa em 1940 com a Scuderia Ferrari, mas os planos foram naturalmente abortados com a eclosão da segunda guerra. 

Arzani não voltaria às pistas.

Infelizmente o grande piloto argentino faleceu ainda relativamente jovem em 1952 perto de Rio Ceballos na província de Córdoba para onde se havia retirado para tratamento de doença pulmonar.

  

CARLO GAZZABINI

Itália

Equipe: particular / (Scuderia Ferrari ?)

Carro: Alfa Romeo 8C “Monza” motor 2.600 (chassis 2311216 ?)


Carlo Gazzabini Foto Correio da Manhã 6/6/37

O piloto italiano Carlo Gazzabini era um conhecido piloto profissional de testes e de competição. Natural de Brescia (segundo outros de Roma) participou de doze “Mille Miglias”.


Foto: Jornal  A Batalha” - 5/6/37

Gazzabini tinha um curriculum conhecido e desde 1927 já aparecia nas Mille Miglia com OM (marca italiana da Societá Anonima Officine Mecchaniche) invariavelmente com bons resultados, presumindo-se até que tivesse alguma ligação ou apoio de fábrica.

Em 1930 obteve um resultado que chamou atenção conseguindo o 5º lugar absoluto com a OM 665 SS Mille Miglia (6 cil, 2,2 litros com compressor chassis 1095) e 1º lugar na categoria até 2 litros. Esse carro era um rival direto das Alfas 6C 1750. 

Em 1931, 32 e 33 passou a competir com Alfas assinalando outros três bons resultados nas famosas Mille Miglia, como veremos a seguir.

Competiu com Alfa 6C 1750 em 1931 se classificando oitavo na classificação geral e primeiro entre os carros com carroceria fechada. Sempre com Alfas, em 1932 foi décimo e em 1933 foi novamente oitavo na classificação geral.

A partir de 1932 Gazzabini passa a ser visto ao volante de uma Alfa Romeo 8C 2300 Monza, chassis 2111033, em que aparece no Circuito di Avellino em 24/7/32 (Coppa Principe di Piemonte no longo circuito de 24,9 kms). 

O livro de Angela Cherrett porem dá a entender que Gazzabini tinha vendido recentemente o carro a seu co-piloto Paolo Cantano Nessa mesma prova em que Gazzabini se apresenta com o chassis 2111033, Nuvolari vence com a “Monza” chassis 2111044 e Guido D`Ippolito fica em segundo possivelmente com a “Monza” chassis 2111029.    

Gazzabini a partir daí vai competir em provas italianas sem muita regularidade, mas várias delas com uma Alfa 8 C Monza, presumivelmente o mesmo carro com a qual foi visto nas Mille Miglia  em 4/4/37 em dupla com Giglio Antinori. 


COINCIDÊNCIA

Curiosamente, Gazzabini estava  na mesma “Coppa Principessa di Piemonte” em 25 de abril de 1937, no Circuito de Posillipo em Nápoles, na qual Arzani estava fazendo sua prova “de estréia” com a 8 C 35 e boa parte da Scuderia Ferrari da época estava presente  (Farina, Siena , Biondetti e Villoresi).

Gazzabini terminou essa prova em 6º lugar com um Alfa Monza. Mas qual seria o chassis?

A obra de Simon Moore dá a entender que o primeiro Alfa 8C 2300 Monza ligado a Gazzabini (chassis 2111033) era um spider de carroceria Touring, que seria um dos quatro carros inscritos na equipe de fabrica nas Mille Miglia de 1932 e que teria ido para a Inglaterra em 1935, o que descartaria ser o mesmo chassis das aparições posteriores de Gazzabini com o modelo. Isso bate com as informações do livro de Angela Cherret.

Gazzabini não tinha curriculum internacional, embora fosse um piloto experiente em provas italianas e sua vinda presume uma incorporação “ad hoc” ou “de ocasião” à Scuderia Ferrari e a viagem com aproveitamento do incentivo financeiro do Comendador D`Angelo.

Eventualmente Gazzabini se enturmou com a equipe Ferrari na prova de Nápoles e conseguiu apoio para vir junto com os demais no mesmo “pacote” com apoio do Comendador Sábbado D´Angelo visto que chegaram no mesmo navio. 

Corroborando a tese, alguns jornais da época citam Gazzabini como membro da Scuderia Ferrari, o que, porém, não se confirma conforme os dados da época. Tudo leva a crer que Gazzabini se agregou à Scuderia pontualmente para essa viagem.

Certamente Gazzabini, como tantos outros europeus, veio com segundas intenções. A Alfa Monza estava deixando se ser tão competitiva na Europa e Gazzabini vislumbrou a chance de vender sua para algum piloto local e realmente o fez vendendo a Alfa para Escuderia Excelsior, cujo principal piloto Chico Landi depois teria belas participações com ela no Brasil, após várias atualizações feitas pela equipe do brasileiro.

Mas seria esse Alfa Monza de Gazzabini um carro da Scuderia Ferrari?  O fato de que Gazzabini estivesse incluído no “pacote de viagem” scuderia” e que sua 8C Monza estivesse “atualizada” com o motor 2.600 de cerca de 180 HPs, conforme várias fontes da época, levam a crer que a Scuderia Ferrari lhe cedeu o carro e lhe incluiu no “pacote de viagem“ com a intenção explicita de demonstrar e vender o carro na América do Sul.

Então não se pode descartar que Gazzabini tivesse embarcado com uma das Alfas Monza remanescentes da própria Scuderia Ferrari com o objetivo claro de demonstrá-la e vendê-la na América do Sul.

Dito e Feito: a presença de Gazzabini e sua Alfa teria grandes consequências para o automobilismo brasileiro por conta de seu carro ter se tornado na sequência o novo bólido de Chico Landi.


Foto: Carlo Gazzabini na Gávea corre (a pé) para se apresentar ao “exame médico” da prova de 1937 (foto: O Correio de São Paulo 5/6/37).

Por fim, existem informações que uma 8C 2300 Monza da terceira série “ex-scuderia Ferrari” teria sido encontrada e “resgatada” no Brasil no Brasil como uma Alfa Monza “ex-Chico Landi” Esse seria o chassis 2311216, eventualmente equipado com o motor 2.600 Não podemos chegar a uma conclusão definitiva sobre o chassis usado por Gazzabini no Brasil na Gávea de 1937, mas os chassis 8 C 2300 se iniciavam com numeração 211, 221 e 231 sendo esta última o “prefixo” da terceira série. Sobre a questão de denominação os especialistas apontam que os chassis curtos de especificação “Monza” eram todos com motor 2300 de origem e que nunca houve oficialmente “8C 2600 Monza”, mas sim carros de corrida que ao longo do tempo receberam o “upgrade” do motor de maior cilindrada.

Gazzabini ainda apareceu nas Mille Miglia de 1938, mas já então com uma Lancia Apprilia e só iria voltar a ser visto no pós -guerra nas temporadas de 1952/53 ao volante de uma Ferrari 212, com a qual presumivelmente participou de sua última Mille Miglia em 1952.


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